Como Medir a Eficácia do Tratamento da Enxaqueca?
Vamos imaginar que você inicia (mais) um tratamento da enxaqueca que te acompanha já há um bom tempo. Não estou me referindo aqui ao tratamento da crise, mas sim ao tratamento preventivo, que tem por objetivo minimizar a ocorrência das crises.
Por incrível que pareça, existe certa dose de confusão no ar quando a questão é se o tratamento da enxaqueca (preventivo, no caso) está funcionando ou não!
O motivo é simples: cada indivíduo tem suas próprias expectativas quanto ao resultado do tratamento da enxaqueca.
Por exemplo, algumas pessoas embarcam no tratamento da enxaqueca com a expectativa de que tudo vai melhorar num piscar de olhos, num passe de mágica, sem a menor necessidade de mudar alguns hábitos e estilo de vida, bastando simplesmente tomar remédios.
Fico sempre me perguntando como tanta gente no mundo pode acreditar num absurdo desses, numa “cura da enxaqueca por passe de mágica” – aliás um passe de mágica dos mais fajutos – na forma de comprimido!
Claro que toda essa gente vai ficar frustrada com o passar do tempo, quando finalmente se der conta da realidade. Se você é um dos que acreditam nesse tipo de solução, está no site errado – volte agora mesmo para o Google e encontre outro lugar que alimente essa ilusão. Não terá dificuldade em encontrar, pois a internet está repleta deles.
Já outras pessoas, felizmente, compreendem a realidade que uma doença crônica, como a enxaqueca, não deveria ser encarada de forma simplista, e que o tratamento da enxaqueca visando a prevenção da mesma deve ir além de não fazer mais nada a não ser ficar tomando remédios preventivos passivamente. Se você é uma dessas pessoas, continue lendo.
O que é, para você, melhorar da enxaqueca?
Digamos que, após vários meses de tratamento da enxaqueca, uma pessoa que tinha dor de cabeça toda semana passou a ter enxaqueca a cada 15 dias, ou a cada mês. Embora isso possa parecer, à primeira vista, um claro motivo para qualquer um, que evoluiu daquela situação para esta, ficar contente, muita gente se frustra: “– Não estou melhorando”, queixam-se; “– Quando é que essa droga de enxaqueca vai me deixar em paz?”.
Acontece que, objetivamente falando, esse indivíduo de fato teve uma melhora com o tratamento da enxaqueca, ainda que parcial e insuficiente: a frequência da dor de cabeça dele, que era semanal, passou a quinzenal ou mensal. Essa melhora pode parecer óbvia para uns mas não para outros.
Porém a matemática não mente: a melhora foi de 50 (redução de semanal para quinzenal) a 75% (redução de semanal para mensal) com o tratamento da enxaqueca instituído até aqui. É só fazer a conta: num caso, o indivíduo que apresentava 4 crises em 1 mês passou a apresentar duas – uma redução de 50%; e no outro caso, o indivíduo que apresentava 4 crises ao mês passou a apresentar uma – uma redução de 75%.
Decidi escrever este artigo para explicar a você o que nós médicos entendemos, ou deveríamos entender, por melhora, no tocante ao tratamento preventivo da enxaqueca. Em outras palavras, qual a melhor forma de saber se a estratégia de tratamento da enxaqueca de cada um dos nossos pacientes está no caminho certo.
Para saber se o tratamento da enxaqueca está dando resultado, é preciso medir objetivamente os seguintes parâmetros, comparando os dados de antes do início do tratamento da enxaqueca com aqueles após, ou seja, no momento atual.
Os 5 parâmetros objetivos de eficácia do tratamento da enxaqueca:
- Frequência da dor de cabeça;
- Intensidade da dor;
- Duração de cada crise;
- Sintomas associados, por exemplo, enjôo, vômitos, aura, tonturas etc.;
- Aumento na resposta aos medicamentos para crise de enxaqueca.
Em outras palavras:
Como evoluiu a frequência das dores de cabeça e demais sintomas da enxaqueca?
As crises se tornaram menos frequentes com o tratamento?
E as dores de cabeça que não as crises (aquelas mais leves)? Também passaram a ocorrer com menos frequência?
Melhora n° 1:
Algumas pessoas podem ter apresentado diminuição da frequência das dores leves a moderadas, mas ainda não ocorreu diminuição da frequência das crises fortes. Ainda assim, isso já significa um início de melhora. Vamos dizer que, no período de 1 mês, uma paciente costuma ter 8 dores de cabeça, das quais 6 são leves a moderadas e 2 são fortes. Se, após 1 mês de tratamento, essa paciente contar que as crises fortes não diminuíram (portanto ocorreram 2 crises fortes), mas que as dores leves a moderadas se reduziram de um total de 6 para apenas uma ou duas, pode-se dizer que ocorreu melhora. Insuficiente ou não, isso é outra coisa. Mas objetivamente falando, de acordo com os 5 parâmetros acima, ocorreu uma melhora.
Melhora n° 2:
Outras pessoas podem ter apresentado menos crises fortes, porém sem diminuição da frequência da dor de cabeça leve a moderada. Em outras palavras, ainda que a frequência de todas as dores de cabeça num mês, entre uma consulta e outra, tenha se mantido (por exemplo, 8 episódios de dor de cabeça no total, em 1 mês), pode-se dizer que houve melhora se a frequência das crises fortes tiver diminuído. Digamos que uma pessoa tinha 8 dores de cabeça, em média, por mês, das quais 4 eram fortes, e as demais, leves a moderadas. Se ao cabo de 1 mês de tratamento essa pessoa continuou com um total de 8 dores de cabeça, mas apenas uma delas foi de intensidade forte, pode-se dizer que ocorreu melhora. Insuficiente ou não, isso é outro ponto. Mas que ocorreu melhora, ocorreu.
Melhora n° 3:
Certas pessoas, mais sortudas, podem ter conseguido diminuição tanto na frequência da dor de cabeça de intensidade forte, quanto da leve e moderada. Ou seja, se apresentava um total de 8 dores de cabeça, das quais 4 fortes e 4 leves a moderadas, e após 1 mês de tratamento passou a apresentar 2 dores de cabeça, das quais uma forte e uma leve a moderada, pode-se dizer que ocorreu melhora.
Melhora n° 4:
Nos 3 primeiros tipos de melhora, combinamos as variáveis frequência e intensidade. Vamos introduzir agora a variável duração. Se a frequência e a intensidade não se alteraram, mas a duração das dores de cabeça diminuiu, podemos afirmar que ocorreu uma melhora. É claro que as variáveis frequência, intensidade e duração podem, e costumam, ocorrer de forma não isolada, mas sim em vários tipos de combinação. É desejável registrar ao máximo, por escrito, quais dessas variáveis sofreram diminuição num determinado período de tratamento que se quer avaliar, e quanto elas diminuíram.
Responda às Seguintes Perguntas:
Precisamos nos perguntar:
- As crises deixaram de ser tão fortes e incapacitantes?
- Aquelas dores de cabeça de intensidade média (moderadas) passaram a leves e as leves passaram a ser muito leves ou inexistentes, graças ao tratamento da enxaqueca?
- Para cada episódio de enxaqueca, não importando qual a intensidade da dor de cabeça, qual foi a duração desse episódio em comparação a antes do início do tratamento da enxaqueca? Se antes do tratamento a crise durava 2 dias e agora dura 6 horas, isso é uma melhora.
Esses parâmetros – frequência, intensidade e duração – devem ser medidos periodicamente. Para meus pacientes, em geral realizo esta avaliação mensalmente. Assim, posso verificar se a estrategia de tratamento da enxaqueca deste(a) paciente se encontra no rumo certo ou se é necessário fazer modificações.
Melhora no. 5:
Devemos considerar a resposta ao remédio da crise. Vamos supor que o remédio X, que nunca funcionou ou parou de funcionar para aquele paciente, fez efeito ou voltou a fazer efeito, com a introdução (ou modificação) de um tratamento preventivo. Podemos então afirmar que ocorreu melhora.
Similarmente, se antes do período de tratamento em questão, eram precisos 2 comprimidos do remédio X em caso de dor de cabeça, e agora é preciso apenas 1 comprimido para abortar essa mesma dor, então houve melhora. Por fim, se a dose do remédio X não se modificou, mas o tempo que levou para o remédio fazer efeito tiver diminuído, então houve melhora.
Melhora n° 5:
Alguns indivíduos, especialmente no início de um tratamento da enxaqueca, podem deixar de ter tantas dores de cabeça e passar a ter apenas “ameaças”, ou seja, sintomas relativamente vagos que anteriormente teriam sido seguidos por uma crise de enxaqueca, mas que passaram a ocorrer isoladamente, sem as crises que normalmente se sucederiam. Isso, para mim, é uma forma de melhora. Um sinal de que estamos no caminho certo.
Melhora n° 6:
Dificilmente alguém ficaria satisfeito com o seguinte tipo de melhora, mas que ainda assim pode-se chamar de melhora: Certas pessoas podem deixar de ter tantas dores de cabeça, porém apresentam episódios de outros sintomas da enxaqueca que não a dor de cabeça, e que antes do início do tratamento ocorriam em conjunto com a dor de cabeça, como por exemplo, mal-estar, enjôo, tonturas, bocejos, alterações de humor etc. Podemos chamar isso de crises de enxaqueca sem dor de cabeça, ou com pouca dor. Lembrando mais uma vez que enxaqueca não compreende só uma dor de cabeça, e que a dor de cabeça pode ser muito leve ou até mesmo estar ausente numa crise de enxaqueca.
Melhora n° 7:
Inversamente à situação descrita na Melhora n°6, alguns pacientes podem deixar de apresentar tantos sintomas acompanhantes, porém as dores de cabeça ainda persistem. Sinal de melhora também. É claro que o tratamento não deverá parar por aí.
O tratamento da enxaqueca é um processo progressivo.
Claro que ninguém vai negar que o objetivo principal de todo o tratamento da enxaqueca é ter o mínimo possível de dor de cabeça, crises, sintomas acompanhantes, enfim sofrimento. Mas é preciso medir periodicamente o progresso. Esse monitoramento serve não apenas para avaliar a eficácia do seu tratamento da enxaqueca, mas também para que você nunca perca o ânimo, o sonho de viver sem (ou na impossibilidade, com o mínimo que seja, de) enxaqueca.
Devido à falta de informação, podem acabar sendo criadas falsas expectativas. Já vi pessoas que melhoraram significativamente, em poucos meses, na frequência, intensidade, duração e resposta aos remédios de sua enxaqueca, porém mesmo assim encontravam-se frustradas, desoladas. “– Puxa vida, estou fazendo tantas coisas – acompanhamento médico, remédios, e até mudanças de hábitos e estilo de vida, com tanta dificuldade, tanto sacrifício, e mesmo assim tive uma crise ontem!”. Esse tipo de sensação, criada por uma falsa e errônea expectativa, é negativa em todos os sentidos, pois apenas desmotiva o doente, podendo até resultar num abandono de seus esforços e desistência do tratamento como um todo, o que pode resultar num retorno à situação anterior, à estaca zero. Portanto, anime-se a cada melhora descrita acima que você possa identificar no seu tratamento da enxaqueca, e estreite a parceria com o médico de sua confiança, visando o alívio máximo da sua enxaqueca através do tratamento.
Minha dica: tenha sempre em mente os critérios objetivos enumerados neste artigo para medir sua melhora. Crie um diário conforme explico no meu livro (que aliás você deveria ler – ou reler! – o quanto antes, pois ensina as mudanças de hábitos e estilo de vida necessárias para melhorar da enxaqueca) e, em parceria com seu médico, poderá verificar as variações dos parâmetros de frequência, intensidade, duração, etc, de suas crises de enxaqueca, com o passar do tempo, “acertando o alvo” sempre cada vez mais perto do objetivo de alívio máximo!
Informações
Agendamento
Dr. Alexandre Feldman, CRM(SP) 59046
Atendimento Online e Presencial